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Blocos de rua

Com clima alternativo, tribos agitam pré-Carnaval do Beco das Artes no Rio

Carolina Farias

Colaboração para o UOL

21/01/2018 23h13

Um beco do centro do Rio de Janeiro, que desemboca na histórica praça Tiradentes, reuniu diversidade para celebrar a cultura negra no pré-Carnaval do Beco das Artes. O lugar, também conhecido como beco do Bar do Nanam, é um dos pontos mais alternativos de diversão atualmente no Rio. Num público eclético, se destacaram cabelos black power, tranças, adereços de cabeça e, claro, corpos brilhantes com purpurina.

Apesar do perfil alternativo, neste ano para a segunda edição do evento os organizadores buscaram patrocínio para melhorar a estrutura, como segurança e banheiros químicos. Diferentemente do ano passado, com cinco dias de pré-Carnaval, neste ano a organização diminuiu para dois dias de evento, para inclusive diminuir o público.

"Ano passado foram dez mil pessoas todos os dias. Saiu do controle. Pensamos em fazer um pré-Carnaval na rua porque existem muitos eventos pagos. Aqui não, tem o bloco e os shows de graça", explicou um dos produtores do evento, Cainã Corrêa.

O primeiro dia de evento foi dedicado à cultura negra, com desfile do bloco Afrojazz pela praça e apresentação da banda Groove in Bahia no beco. Na próxima semana o pré será dedicado às mulheres, com os blocos Mulheres Rodadas, É Samba Que Elas Querem e o Baile da Lilu, com funks feministas.

"É a celebração de todas as culturas que se reúnem aqui. É a homenagem às mulheres é porque já tivemos incidentes com mulheres aqui, como as que foram agredidas porque reagiram ao assédio", afirmou Cainã sobre episódios que ele e nenhum dos frequentadores quem ver na folia.

Para a estudante Katarina Braga, 20, o beco é um lugar descolado, onde todos os ritmos se encontram.

"Venho aqui porque sempre tem música legal como samba e Rap. Além de ter bastante gente bonita", acrescentou a jovem, que vestia uma fantasia estilosa de Mulher-Maravilha.

O bailarino e ator Aley Moreira celebrou o tema do evento. Frequentador do beco, para ele o lugar abraça todos os tipos e suas diferenças.

"Aqui todos podem transitar sem pensar em problemas, sem distinção de sexo e raça. É tudo bem na paz e incluindo as diferenças. Além de ser negro, eu estudo o corpo negro na dança. Isso aqui além de um trabalho, aula e meu rolê", afirmou.

Quem também foi ao beco pelas atrações que celebraram a identidade negra foi o figurinista Wayner Felino, 23, que foi devidamente montado para a folia.

Ensaio para o Carnaval tem Bloco AfroJazz passeando pelo centro do Rio - Bruna Prado/UOL - Bruna Prado/UOL
Katarina Braga caprichou para o pré-Carnaval
Imagem: Bruna Prado/UOL

"Aqui se respeita (a pessoa) não-binário. Em outros ambientes posso me sentir mal, mas aqui não tem problema", disse Felino, que estava acompanhado do amigo, também figurinista, Ramon Carvalho, 25, também vestido de saia e salto alto.

"Gosto de ambientes simples e onde me sinto livre. Vai ter negro e viado sim para representar e se divertir", garantiu o figurinista.

Apesar de marcado para as 17h, somente por volta das 19h30 o cortejo saiu. Enquanto não acontecia o bloco, um DJ botou o público para dançar. Esperando a saída do bloco, a professora de dança Sabrina Chaves, 28, se preparava para se apresentar no cortejo - ela e mais cinco dançarinas apresentaram coreografias de danças afro.

"Estudo danças da África do Oeste (Guiné, Senegal, Mali). Meu grupo é o único que faz pesquisas de dança e música dessa região no Rio. É importante celebrar nossa cultura não só no Carnaval e no Dia da Consciência Negra, mas sim o ano todo", comentou Sabrina, que também é frequentadora do Nanam.

"É bem diversificado aqui, todo mundo pode ser natural", acrescentou.

Quem também se apresentou no Afrojazz como dançarina foi a analista de sistemas Elaine Preto, 30. Para ela, o Carnaval no beco é de paz. "Aqui é sempre tranquilo, descontraído e desconstruído. Também vai ser assim no Carnaval", afirmou.

Além dos penteados e outros elementos afro, também não faltou no bloco as fantasias improvisadas ou mesmo trajes mais tradicionais.

Gabi Carvalho, produtora de moda de 23 anos, apostou em uma fantasia que chamou de "fada safada", com adereços no cabelo pintado de rosa e roupa colorida. "Essa roupa é do ano passado, ainda vou ao Saara para decidir o que vou usar neste Carnaval. Mas não vai ser nada tendência, eu vou criar meu estilo", garantiu.

Com um cocar de índia e muito brilho no rosto, a tradutora Nathália Carneiro, 33, se esbaldou ao som dos metais e percussão do bloco. "Aqui encontramos todos os estilos, é fácil de chegar e é mais 'em conta' que outros lugares da cidade", disse a foliã.

Com body de arco-íris e purpurina, a enfermeira Ainá da Conceição, 25, também se jogou no bloco do beco.

"Aqui sempre se valoriza a cultura e é bem legal hoje celebrarem a cultura negra", afirmou a jovem.

A liberdade de diversidade que os eventos no beco têm atrai a designer de moda Fernanda Luzia, 31, que usou um brinco de criação própria para a folia. Sempre venho em samba aqui. É um lugar muito livre", completou.

Ainá da Conceicao curte o pré-Carnaval 2018 no Beco das Artes no Rio de Janeiro - Bruna Prado/UOL - Bruna Prado/UOL
Ainá da Conceição curte o pré-Carnaval 2018 no Beco das Artes no Rio de Janeiro
Imagem: Bruna Prado/UOL

Sacolé da Malandra

O casal Gabriela Amado, estudante de 25 anos, e Demian Bigio, editor de vídeo de 26 anos, resolveu empreender no pré-Carnaval neste domingo na venda de sacolé com bebida alcoólica. A ideia não é novidade, mas a dupla resolveu apostar em um assunto que está em alta para chamar atenção.

Com peruca feminina e o biquíni de fita isolante que remetia ao usado pela cantora Anitta no clipe de "Vai Malandra", Demian alcançou o resultado que queria para o "Sacolé da Malandra", como anunciavam em uma placa. Resultado: venderam as 50 unidades do produto que levaram - cada um a R$ 5.

"Todo ano tem alguma coisa em alta, uma notícia ou um meme. Esse ano é 'Vai Malandra'. Só me surpeendi que eu era o único vestido de Anitta dos blocos", afirmou o editor, que junto com a mulher circularam por vários blocos para vender sacolé.

"Pretendemos fazer mais em todo Carnaval", acrescentou Gabriela.

A fantasia não incomodou Demian, mas um pensamento o deixava preocupado com o dia seguinte.

"Não estou preocupado com a puxada para retirar a fita. Estou 'bolado' é que amanhã vou estar com a marquinha perfeita do biquíni", disse o editor que foi aos blocos sem se proteger do sol.